Rituais & Feitiços

Amuletos apotropaicos

Introdução

  • Amuleto (do grego φῠλᾰκτήρῐον, transliterado phylakterion, do latim, amuletum) é o ato ou efeito de afastar o mal, proteger ou salvaguardar.
  • Os amuletos podem ser imagens e textos em uma variedade de materiais – metal, papiros, mosaicos, pedras preciosas – fabricados para proteger, curar ou conceder algum benefício abstrato às pessoas que os usaram em seus corpos ou os colocaram em suas casas.
  • Desse modo, todos os objetos confeccionados ou consagrados por magistas em rituais específicos e fabricados para fins de proteção ou submissão podem ser considerados amuletos.
  • A maioria dos amuletos tinha o objetivo de dar à pessoa que os usava proteção geral ou específica contra uma doença determinada, como problemas no estômago, cólica, febre, doenças nos olhos ou na coluna.
  • Outros amuletos eram feitos com o propósito de afastar o efeito de maldições já feitas ou proteger contra maldições que poderiam vir a ser lançadas no futuro como o que era feito com kolossoi e/ou placas de imprecação.
  • Um amuleto poderia ser usado inclusive para anular a ação de outros amuletos de proteção que o alvo poderia estar usando.

Papiros Gregos Mágicos (PGM)

  • Os Papiros Gregos Mágicos (PGM, Papyri Graecae Magicae) são uma coletânea de textos mágicos greco-romanos encontrados no Egito que datam do século II AEC ao século V EC.
  • Pelo menos trinta e cinco sortilégios dos PGM dedicam-se à fabricação de amuletos. Em dezoito, encontramos referência ao uso de pedras e em onze as instruções para a fabricação e consagração de anéis – que podem ou não conter gemas.
  • São detalhados nos encantamentos os materiais necessários à confecção dos artefatos, o ritual em que devem ser consagrados, os símbolos, textos ou desenhos que devem ser gravados nas peças e como os objetos devem ser manipulados a fim de se garantir a sua eficácia.
  • Os papiros mágicos gregos incluem instruções para criação de amuletos de proteção contra encantamentos, um dos quais requer inscrição e desenho em chumbo. O desenho recomendado não é o mesmo traçado no papiro – o desenho de uma figura amarrada e pregada carregando uma cabeça sem corpo e acompanhada por animal semelhante a um cão.
  • No Egito tardio, o uso de amuletos mágicos era muito comum. Na vida cotidiana, o amuleto era empregado de forma apotropaica, visando a proteger o portador contra todo tipo de mal, e, também, durante ritos funerários.
  • As pessoas acreditavam que os amuletos tinham o poder de produzir efeitos positivos no outro e de influenciar as decisões e vontades dos indivíduos que os portassem.
  • Na coletânea dos PGM, são encontrados sortilégios para a fabricação de inúmeros amuletos, em distintos suportes: sob a forma de anéis, papiros, lamparinas, linho e até mesmo ossos.
  • Outro papiro contém uma instrução para um amuleto sendo duas lamelas de ferro inscritas com três versos de Homero. O amuleto pode ser usado com vários propósitos, incluindo refrear outro encantamento de amarração. Nesse caso, ele é usado em conjunto com uma concha do mar enterrada na cova de alguém que morreu recentemente, que também recebe a inscrição dos mesmos versos e de algumas voces magicae.
  • As instruções para a fabricação de amuletos contidos nos PGM podem ser classificadas em duas categorias principais:
    • Amuletos de proteção
      • Amuletos usados como dispositivo contra o poder das divindades durante a invocação;
      • Amuletos empregados para repelir divindades;
      • Amuletos contra daemones.
    • Amuletos de invocação
      • Usados como aprimoramento durante a invocação e formam um grupo mais heterogêneo, uma vez que são usados em receitas para fins divinatórios, tornar o mago invisível, submissão amorosa e até mesmo garantir vitória.

Apotropaei

  • Apotropaei (em grego: Ἀποτρόπαιοι) eram na Grécia antiga certas divindades que os helenos acreditavam poder evitar o perigo e protegerem do mal.
  • De maneira geral, é possível pedir auxílio e proteção a todas as divindades, principalmente aquelas que você tem um culto pessoal. No entanto, as divindades apotropaicas eram mais comuns de serem vistas sendo citadas em magias de proteção ou magia apotropaicas.
  • Os deuses Apolo, Zeus e Atenas eram adorados com o epíteto de culto Apotropaios (Averter) em várias cidades gregas e residências. 
  • Os deuses Hermes e Hécate eram invocados para proteção em viagens por terem o domínio das estradas.
  • As deusas Ártemis, Ilítia, Hera e Hécate protegiam os trabalhos de partos e possuem epítetos relacionados às crianças como Kourotrophos. Em especial, Ártemis protegia as meninas e Apolo protegia os meninos.

Encantamento de proteção

  • O amuleto poderia ser feito de diferentes formas, podendo ser objetos e desenhos feitos em placas de metal (ouro, prata, estanho ou chumbo) ou calcário. Inclusive, um encanto escrito poderia atuar como um amuleto ou ser recitado durante a construção do amuleto, veja alguns exemplos:

“Afaste, afaste a maldição de Rufina. E se alguém se referir no futuro, volte a maldição para ele.”

Encantamento de amuleto encontrado na Ásia Menor, cerca de I AEC a I EC. CT n° 120 = Kotansky, 1994, n° 36.

“Liberte Juliana de todo feitiço (pharmaka), e de todo sofrimento e de toda influência mágica, e manifestação demoníaca à noite e durante o dia.”

Encantamento de amuleto para proteção geral. Encontrado em Beoria, cerca de II-III EC. Kotansky, 1994, n° 46.

“Eu amarro Filonidas e Xenódico, acreditanto ser correto me vingar deles e ter compensação contra aqueles que me expulsaram da casa de Demétrio porque sofro de dores de cabeça e outras dores. Se eles lançaram um encantamento de amarração (peridesmos) para me envolver, que a obscuridade o leve. Filonidas… que eles não consigam falar e fiquem sem voz e sem sexo.”

Placa calcária de Tel Sandahannah encontrada em Israel. CY n° 107, Wunsch, 1902 n° 34.

Símbolos de proteção

I) Gorgonião

  • Gorgonião (em grego clássico: Γοργόνειον; romanizado: Gorgóneion) era conhecida como a imagem da cabeça da Medusa (Górgona) aparecia no objeto utilizado para afugentar o mal por Perseu que decapitou Medusa e utilizou posteriormente sua cabeça como arma.
  • Conforme declarado na Ilíada de Homero, Atena e Zeus, carregavam um dispositivo chamado de égide ou aegis (do grego antigo αἰγίς aigís) interpretado de várias maneiras como uma pele de animal ou um escudo.
  • É dito que na égide de Atenas tem a cabeça de uma Górgona para assustar seus inimigos. Pode haver uma conexão com uma divindade chamada Aex ou Aix, uma filha de Helios e uma enfermeira de Zeus ou, alternativamente, uma amante de Zeus (Hyginus , Astronomica 2. 13).

II) Filactério

  • São placas ou pergaminhos contendo símbolos, voces magicae e encantamentos.

Um filatério, um guardião contra daemons, contra fantasmas, contra toda doença e sofrimento, a ser inscrita numa folha de ouro ou prata ou estanho ou em papiro hierático. Quando usada, funciona com grande poder pois seu nome é o nome poderoso do grande deus e seu selo, e é o seguinte: KMÉPHIS CHPHYRIS IAEÓ IAÓ AEÉ IAÓ OÓ AIÓN IAEÓBAPHRENE MOUNOTHILARIKRIPHIAE Y EAIPHIRKIRALITHANYOMENERPHABÓEAI. Esses são os nomes; a figura é assim: que a Cobra esteja mordendo a própria cauda, os nomes estejam dentro do círculo descrito pela cobra e os caracteres sejam assim: [vide a imagem]

A figura toda é assim desenhada, como se vê abaixo, com o feitiço, “Protege meu corpo e toda minha alma, ____”. E quando a tiveres consagrado, que tu a carregues consigo.

Filatério de proteção espiritual. PGM VII. 579–90.

Para ganhar amizade, favores, sucesso e amigos. Pegue uma tira de estanho e grave nela com um stilus de bronze. Mantenha-te puro enquanto o carrega.

Estela de Afrodite. PGM VII. 215–18.

III) Anéis

  • Nos PGM, diferentemente dos demais amuletos que são confeccionados apenas para a execução de determinado feitiço, os anéis passam a ser objetos de poder excepcionais, cujo efeito é permanente e seu uso, nestas condições, está restrito ao magista, podendo ser empregados em inúmeros encantamentos.
  • Os anéis poderiam ser empregados tanto como amuletos protetores quanto como instrumentos nas operações mágicas, tendo em vista que eram objetos que funcionavam como catalisadores do poder das divindades e que tinham capacidade de agir em favor do magista.
  • Como podemos depreender dos fragmentos do PGM, o anel se configurava como um objeto de poder que atuava como um receptáculo da essência divina e seu uso estava disponível ao profissional do rito, o magista.
  • Veja alguns trechos recolhidos dos papiros:
    • “consagra e empodera este objeto para mim” (PGM XII, 201-69);
    • “conceda encanto sexual a este anel” (PGM IV, 1675);
    • “Agathodaimon, o assistente, realize tudo para mim com o uso deste anel” (PGM IV, 1710);
    • “sele com seu próprio anel” (PGM IV, 2955);
    • “depois de colocar o anel no dedo indicador da mão esquerda com a pedra dentro, mantenha-o assim e, ao deitar, vá dormir segurando a pedra junto ao ouvido esquerdo” (PGM V, 445).
  • O uso mágico dos anéis também pode incluir:
    • Feitiços específicos, como a submissão amorosa (PGM LXI, 1-38);
    • Oniromancia, a adivinhação com base na adivinhação dos sonhos (PGM V, 447-458);
    • Sortilégios que prometiam poderes extraordinários àquele que o portasse (PGM IV, 1596-1715).
    • Dactilomancia, a adivinhação por meio de anéis.

“Pegue um lagarto do campo e coloque-o em óleo de lírio até que seja deificado. Em seguida, grave / a [imagem de] Asclépio [adorado] em Mênfis em um anel de ferro […] e coloque [o anel] no [óleo] de lírios [no qual o lagarto foi afogado]. E quando você usar [o anel], pegue-o e aponte-o para a estrela polar, dizendo este feitiço 7 vezes: “MENOPHRI que estão sentados nos querubins, envie-me / o verdadeiro Asclépio, não algum daimon enganoso em vez de deus”. Depois leve o queimador de incenso para onde você vai dormir e queime três grãos de incenso e acene o anel na fumaça do incenso, dizendo sete vezes o feitiço […] senhor Asclépio apareça. E use o anel no dedo indicador da sua mão direita”

Feitiço para a consagração de um anel para prática onírica, com fins de cura. PGM VII, 628-42, entre os séculos III e IV EC. Traduzido por Morton Smith.

Um anel. Um pequeno anel para sucesso, favor e vitória. Ele torna homens famosos, grandes, admirados e ricos como podem ser, ou ele torna possível a amizade com tais homens. O anel é sempre seu [para usar] de modo justo e exitoso em todos os propósitos. Ele contém um nome insuperável. Hélio deve ser entalhado em uma pedra heliotrópica como se segue:9 uma grossa serpente na forma de uma espiral deve ser [mostrada] tendo a sua cauda em sua / boca. Dentro [do círculo formado pela] serpente coloque um escaravelho sagrado [besouro cercado por] raios. No lado de trás da pedra você deve inscrever o nome em hieróglifos, como os profetas o pronunciam. Então, tendo consagrado [o anel], use-o enquanto estiver puro

Fabricação de um anel dedicado ao deus Hélio. PGM XII, 270-79, entre os séculos III e IV EC. Traduzido por Morton Smith.

“Um pequeno anel [útil] para todas as operações [mágicas] e para o sucesso. Reis e governadores [tentam obtê-lo]. Muito eficaz. Pegue um jaspe da cor do ar, grave nele uma cobra em círculo com a cauda na boca, e também no meio [do círculo formado] pela cobra [Selene] com duas estrelas nos dois chifres e, acima deles, Hélio, ao lado de quem ABRASAX deve ser inscrito; e no lado oposto da pedra desta inscrição, o mesmo nome ABRASAX, e ao redor você escreverá o grande e sagrado e onipotente [feitiço], o nome IAO SABAOTH. E quando você consagrar a pedra use-a em um anel de ouro, quando precisar, [desde que você esteja puro [naquele momento], e você terá sucesso em tudo o que desejar. Você deve consagrar o anel junto com a pedra no ritual usado para todos esses objetos.”

Orientações para a fabricação de outro anel útil para qualquer operação mágica. PGM XII, 201-10, datado do século IV. Traduzido por Morton Smith.

IV) Olho de proteção

  • Os olhos eram frequentemente pintados para afastar o mau-olhado. Um olho apotropaico exagerado ou um par de olhos foram pintados em recipientes gregos para beber, chamados kylikes (copo para os olhos), desde o século VI AEC até o final do período clássico. 
  • Os olhos exagerados podem ter sido destinados a impedir que espíritos malignos entrassem na boca enquanto bebia. 
  • Os barcos de pesca em algumas partes da região do Mediterrâneo ainda têm olhos estilizados pintados na proa.
  • Muitas outras culturas como egípcias, mesopotâmias, árabes, persas e hindu utilizavam olhos como símbolos de proteção.
“Entre dois olhos enormes vê-se máscara ritual de Dioniso com tranças, barba longa e coroa de hera, de onde saem ramos de videiras. A finalidade dos olhos era apotropaica, i.e., procurava afastar malefícios e/ou a má sorte.” Portal Grécia Antiga. Máscara de Dioniso. Cerca de 520-510 AEC. Cratera-coluna ática de figuras negras “com olhos”. Catálogo 0462. New York, Museu Metropolitano de Arte. RIBEIRO JR., Wilson A. Máscara de Dioniso. Portal Graecia Antiqua, São Carlos. URL: greciantiga.org/img.asp?num=0462. Data da consulta: 17/07/2023.
  • O amuleto de um olho chamado atualmente de “olho grego” ou “olho turco” (em turco: nazar boncuğu) se destina a proteger contra o mau-olhado.
  • É geralmente visto no formato de gota aplainada ou como um ornamento de vidro pendurado, feito à mão e colorido, e é usado como um colar ou uma pulseira, ou ligados aos tornozelos. Geralmente consiste de círculos concêntricos ou formas de gotas – de dentro para fora: azul escuro (ou preto), azul claro, branco e azul escuro (ocasionalmente com um círculo de bordas amarelas/douradas) – e por vezes referido como o olho azul.
  • A origem do olho grego é incerta. Há indícios de uso no Egito, na Síria, na Índia e na Mesopotâmia, entre o período de 5.000 AEC a 1.500 AEC. Entretanto, ficou popular na Turquia e em países árabes, onde é habitualmente encontrado em residências e estabelecimentos comerciais. 
  • Segundo uma conhecida lenda árabe, a peça tornou-se famosa entre os amuletos contra inveja após bloquear os olhares destrutivos de um jovem invejoso. A história conta que um rapaz podia explodir pedras apenas com a energia negativa de seu olhar.

Consagração de amuleto

  • Para que o anel funcionasse como esperado, ele deveria ser consagrado pelos deuses.
  • O ritual de consagração do anel assegurava a união do sacerdote-mago com o divino, durante a qual eram revelados ao iniciado o nome mágico da divindade, o saber secreto que permitia ao sacerdote-mago compelir a potência divina a seu favor, poder este que emanava dos deuses e que poderia ser catalisado por meio do anel, convertido em artefato mágico, para que desta forma tivesse livre acesso às divindades.
  • Nos sortilégios, a conexão com o divino pode ser requerida por meio da invocação direta das divindades ou por meio da consagração de amuletos. O poder conferido ao anel pode ser associado ao termo dynamis (PGM XII, 261-262), compreendido como a capacidade de controlar ou manipular as forças divinas.
  • Importa salientar que a fabricação e a consagração do anel são duas operações mágicas interdependentes e necessárias à transmutação do objeto num instrumento mágico poderoso que o sacerdote-mago pudesse empregar em seu ofício, sempre e em qualquer lugar.

“A consagração [requer] o seguinte: Fazer uma cova em um lugar sagrado aberto ao céu, [ou] se [você não tiver nenhuma] em uma tumba limpa e santificada, direcionada para o leste, fazendo sobre a cova um altar de madeira de arvores frutíferas, sacrifique um ganso todo branco, sem manchas [de cor] e três galos e três pombos. Faça essas ofertas queimadas inteiras e queime, com os pássaros, todo tipo de incenso. Então, de pé junto à cova, olhe para o leste e, derramando uma libação de vinho, mel, leite e açafrão, e envolvendo a fumaça enquanto você ora, [a pedra] na qual estão gravadas as inscrições dizem: “Invoco e suplico a consagração, ó deuses dos céus, ó deuses sob a terra, ó deuses circulando na região do meio a partir do útero. Oh mestres de todos os vivos e mortos, atentos a muitas necessidades de deuses e homens […]. Vinde a mim, você dos quatro ventos, deus, governante de todos, que soprou espíritos nos homens por toda a vida, mestre das coisas boas do mundo. Ouça-me, senhor, cujo nome oculto é inefável. Os daimones, ouvindo-o, estão aterrorizados […] Agathodaimon. Você é o senhor, o criador e nutridor de todos. Você, senhor da vida, governando o reino superior e inferior, cuja justiça não é impiedosa, cujo nome glorioso os hinos dos anjos, que têm a verdade que nunca mente, me ouça e complete para mim esta operação para que eu possa usar esse poder em todo lugar, em todo tempo, sem ser ferido ou afligido, para ser preservado intacto de todo perigo enquanto eu uso esse poder. Sim, senhor, pois para você, o deus do céu, todas as coisas estão sujeitas, e nenhum dos daimones ou espíritos se oporá a mim porque eu invoquei o seu grande nome para a consagração. E novamente clamo a você, segundo os egípcios, […] segundo os gregos, “o rei de todos, governando sozinho”; segundo os sumos sacerdotes, “oculto, invisível, superintendente de todos”; de acordo com os partos, mestre de todos. Consagra e empodera esse objeto para mim, por todo o tempo glorioso da minha vida. Os nomes inscritos no verso da pedra são: IAO SABAOTH ABRASAX”

PGM XII, 211-65. Traduzido por Morton Smith.
  • No encanto descrito acima, podemos verificar como se dava a realização de um rito mágico religioso no espaço fora do templo, local este que seria sacralizado por meio do ritual que o mago realizaria, atestando o deslocamento do local de manifestação divina,uma evidência de que o sacerdote-mago poderia, por meios mágicos, sacralizar um espaço, não sendo necessário que o rito se realizasse exclusivamente no templo.
  • O ritual ainda requeria que fosse feito, pelo sacerdote-mago, um pequeno altar de madeira, onde seriam realizados o sacrifício e a libação, como era corrente, e, por fim, a invocação divina por meio da recitação das voces magicae e fórmulas mágicas de apelo ao deus Hélio, aos daimones e, especialmente, a Agathodaimon.
  • Deste modo, por intermédio do anel, o sacerdote-mago estaria em estreita comunhão com o deus Hélio/ Agathodaimon e seria capaz de potencializar qualquer operação mágica, garantindo ao seu portador sucesso e glória, além de estar protegido pela fórmula mágica ABRASAX.
  • Ao desempenhar o ritual de consagração do anel, o mago tem o propósito de estabelecer uma relação direta com as entidades sobrenaturais, sejam elas deuses ou daimones, com o intuito de aumentar o seu poder ao estar de posse de um artefato poderoso como o anel, garantindo assim toda a força espiritual e mágica para a realização de prodígios.
  • O contato com o divino era o principal recurso simbólico transmitido aos magos, de acordo com o conteúdo presente nos sortilégios dos PGM. Por essa razão, podemos afirmar que o ritual de consagração do anel está atrelado à especialização do sacerdote-mago como um autêntico theios áner. O acesso ao divino não estava disponível a qualquer indivíduo, era preciso conhecer os símbolos, fórmulas e todo o complexo inventário de saberes esotéricos que faziam parte das atividades desempenhadas pelos sacerdotes egípcios.
  • Somente por meio da execução do ritual é que o sacerdote-mago poderia estabelecer um relacionamento pessoal com as divindades e estaria apto a controlar as forças divinas (dynameis). E era a capacidade de manipular as forças divinas por um mortal que alçava o sacerdote- mago à categoria de homem divino, theios áner, visto que era a potência divina que conferia a ele a capacidade de operar a cura, a expulsão de demônios, a submissão amorosa, a adivinhação e toda sorte de favores concedidos aos seres humanos por meio da intervenção do homem divino.

Referências

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  5. Ogden, D., Luck, G., Gordon, R. e Flint, V. Bruxaria e Magia na Europa: Grécia Antiga e Roma. São Paulo: Madras, 2004.
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