Bestiário

Morcegos

Introdução

  • Morcego é um mamífero da ordem Chiroptera (do grego χείρ, cheir, “mão” e πτερόν, pterón, “asa”), onde todos os integrantes desse grupo possuem uma fina membrana de pele entre os dedos, que se conectam das patas para as laterais do corpo formando as asas.
  • Em sua origem no tupi “andyrá”, eles podem ser chamados no Brasil de andirá ou guandira.
  • Eles são animais com hábitos crepusculares e noturnos, vivem sozinhos ou em colônias, tendo expectativa de vida de 10 a 30 anos.
  • Vivem em abrigos durante o dia e saem a noite em busca de alimento, utilizando visão e olfato como guias.
  • Dependendo da espécie, a gestação varia de 2 a 7 meses, nascendo, em geral, um filhote por vez. Nos primeiros meses, os filhotes são alimentados com leite materno até começar a introdução de outros alimentos.
  • Os morcegos são divididos em duas subordens:
    • Megachiroptera que são as raposas-voadoras. Encontrados na África, Oceania e Ásia, podendo ter até 2 m de envergadura e comem frutas;
    • Microchiroptera que são os morcegos verdadeiros. Encontrados em todo o mundo, exceto ilhas isoladas no Polo Norte, e possuem diferentes hábitos alimentares, comendo frutas (frugivoros), insetos (insetívoros) pequenos invertebrados, pólen (polinívoros), néctar (nectarívoros), peixes (piscivoros) ou sangue (hematófagos);
Estruturas do corpo de um morcego da família Phyllostomidae.

Curiosidades sobre os morcegos

  • Um único morcego pode comer até uma vez e meia o seu próprio peso. Algumas espécies que ocorrem no Brasil podem comer até 500 insetos por hora.
  • Morcegos frugívoros são atraíos por plantas com cores opadas, cheiro forte, azedo ou em fermentação e preferem os frutos que ficam pendurados. Colocar bebedouros para beija-flores também pode atrair morcegos.
  • As asas dos morcegos são diferentes das asas de aves porque não possuem penas suportadas por ossos. Essa semelhança em função, mas diferença em origem é chamada de convergência evolutiva. As asas de morcego possuem origem similar com os braços humanos, sendo homólogas.
  • Os morcegos são os únicos mamíferos com voo verdadeiro, onde há bater de asas e planagem.
Exemplos de estruturas de braços e asas.
Algumas das espécies de morcegos: A – Molossus molossus; B – Anoura geoffroyi; C –Artibeus fimbriatus; D – Artibeus lituratus; E – Carollia perspicillata; F – Chiroderma doriae; G – Chrotopterus auritus; H – Dermanura cinerae; I – Desmodus rotundus; J – Glyphonycteris sylvestris; L – Lampronycteris brachyotis; M –Mimon bennettii; N – Plathyrrinus recifinus; O – Pygoderma bilabiatum; P – Tonatia bidens; Q – Trachops cirrhosus; R – Vampyressa pusilla; S – Eptesicus brasiliensis; T – Myotis riparius; U – Myotis ruber. Fonte: Fernando Carvalho.

Morcegos e seu simbolismo

  • Os morcegos estão presentes em diversas culturas ao longo do tempo. São encontrados símbolos de morcegos em templos, artefatos e tumbas egípcias datando 2000 AEC, em esculturas sacrificiais mesoamericanas, igrejas européias da Idade Média, em cemitérios, na iconografia maia pré-hispânica, na arte chinesa, particularmente da Dinastia Qing Média a Final.
  • Símbolos de morcegos também foram encontrados em sítios pré-históricos a mitologia lucaia-taíno, em práticas mortuárias nas Bahamas. Também foram encontrados nas Ilhas Salomão, onde os moradores locais usam os dentes caninos de raposas voadoras como moeda tradicional.
  • Em grande parte da África, várias florestas e bosques sagrados fornecem habitat para o morcego Rousettus aegyptiacus que poliniza várias espécies-chave como o baobá Adansonia digitata.
  • Na Índia, existem bosques sagrados que são refúgio para a raposa voadora Pteropus medius.
Morcegos saindo de caverna.
  • Como cavernas possuem um significado espiritual em diversos povos, muitos morcegos que vivem em cavernas acabaram sendo protegidos e associados a mitos. Esse é caso de cavernas sagradas no Quênia, Gana, Tailândia e Madagascar.
  • Existem estudos que revelam a caça de morcegos para consumo na África, Ásia e Oceania, partes da América Central e do Sul, assim como ilhas nos oceanos Atlântico, Índico e Pacífico. Eles também são caçados para comércio e usos medicinais.
Morcego em pleno voo.
  • Assim como outros animais noturnos, foram criados muitos mitos e estereótipos para os morcegos. Eles são associados a aspectos negativos, sendo odiados e temidos. Eles são ligados a morte, bruxaria, vampiros, espíritos malévolos e maldade. Morcegos foram usados para simbolizar o Diabo.
  • No entanto, no sudoeste asiático, China e Japão, os morcegos são associados à sorte e à boa fortuna, usados como totens espirituais. Na China, os morcegos são símbolos de prosperidade. Se forem vistos 5 morcegos juntos, é sinal de idade avançada, riqueza, saúde, amor virtuoso e morte natural.
  • Entre vários grupos indígenas no México, como Mizteco e Zapoteco, os morcegos eram considerados mensageiros do submundo e símbolos importantes de fertilidade.
Cinco morcegos como símbolo de prosperidade.
  • Na Grécia Antiga, em textos como a Odisséia de Homero (canto XI, versos 605-610), Odisseu vai até o submundo e compara a alma dos mortos aos bandos de morcegos saindo de cavernas. Os morcegos e as cavernas possuem esse aspecto de transição entre mundo dos vivos e mortos.
  • Morcegos também são associados a deuses como Nyx (a noite) e seus filhos Hypnos (o Sono) e Thanatos (a morte), possuindo asas semelhantes de morcegos e se movimentarem a noite.
  • O poeta Esquilo, na peça Eumênides (versos 52-55) descreve as Erínias como morcegos em seu voo noturno e sinistro, trazendo um aspecto ameaçador para as deusas.
  • Não existia o termo “vampiro” na Grécia Antiga, mas existiam criaturas míticas associadas a mulheres, noite e alimentação de sangue como as Lâmias (Λάμια), Empusas (Ἔμπουσαι) e Estriges (Στρίγξ ou strix).
As Erínias. Artista: Gustave Doré.

Morcegos na natureza

  • Em áreas rurais, os seus abrigos costumam ser em cavernas, fendas e rochas, ocos de árvores, folhares e superfície de troncos. Em áreas urbanas, eles buscam casas abandonadas, cômodos com pouco uso, forros de teto, porões, vãos de pontes e buracos em paredes.
  • Devido as suas diferentes formas de alimentação, os morcegos atuam com importantes papéis ecológicos. Morcegos são animais silvestres protegidos por lei (lei 9605 de 12/02/98) e seu extermínio, captura ou maus-tratos é crime.
  • Os frugívoros podem dispersar as sementes e contribuir para a manutenção das florestas.
  • Os insetívoros podem controlar populações de insetos, incluindo aquelas que podem se tornar praga ou transmitir doenças.
  • Morcegos beija-flores podem realizar a polinização das flores. Com isso, são importantes para a reprodução das plantas.
Morcego se alimentando em flor de bananeira.
Língua de morcego especializada em polinização.

Morcegos vampiros

  • Os morcegos que se alimentam de sangue não são encontrados em grandes centros urbanos, sendo mais comuns em áreas rurais.
  • Das cerca de 1293 espécies de morcegos que existem no mundo, apenas 3 se alimentam de sangue de aves e mamíferos. Elas vivem na América Latina, do sul do México ao norte da Argentina.
  • Eles não fazem furos no animal, apenas um pequeno corte com os dentes e lambem o sangue que goteja.

Ecolocalização

  • Os morcegos não são cegos, no entanto, mesmo enxergando, a maioria das espécies utilizam principalmente o sistema de ecolocalização para se orientarem no ambiente noturno.
  • A ecolocalização é a emissão de sons de alta frequência por narinas e boca que, ao se chocar contra alguma superfície, retorna aos morcegos. Com isso, eles podem saber, por exemplo, se há uma árvore por perto, a que distância, qual o seu tamanho.
Ecolocalização.

Zoonozes

  • Ao contrário do que muitos pensam, os morcegos não são pragas urbanas e nem agressivos, eles não costumam atacar pessoas e animais de estimação.
  • Independentemente do hábito alimentar, esses mamíferos usam a mordida como mecanismo de defesa quando são provocados ou manipulados de forma incorreta.
  • Apesar disso, os morcegos podem transmitir doenças, uma delas é a raiva. A raiva é um vírus transmitido pela saliva de animais infectados ao morder, arranhar ou lamber. Um efeito do morcego com raiva é ele perder a capacidade de voo, sendo encontrado durante o dia caídos ou com voo irregular. Os morcegos hematófagos são os mais prováveis de transmitir raiva.
  • As chances de um morcego transmitir raiva é menor do que a chance de gatos e cachorros transmitirem. É importante vacinar os pets anualmente para evitar essa transmissão.
  • Outra doença que pode ser transmitida pelos morcegos é a histoplasmose. Ela é causada pelo fungo Histoplasma capsulatum e ela irrita pulmões e outras partes do corpo, causando dores, febres e outros sintomas. Esse fungo se desenvolve principalmente nas fezes dos morcegos, por isso é preciso ter cuidado em locais onde eles se abrigam.
Diferença entre fezes de rato, lagartixa e morcego.

E se um morcego entrar na sua casa?

  • Eles podem confundir acidentalmente a janela da sua casa com a entrada de seus abrigos. Também ocorre de morcegos habitarem casas e foros em tetos.
  • Se ele entrar na sua casa, acredite, ele vai estar tão assustado quanto você. Não toque o morcego com as mãos desprotegidas, eles podem te morder por medo. Abra todas as portas e janelas para facilitar a fuga dele.
  • Algumas espécies não conseguem levantar voo se estiverem no chão, vão precisar de um apoio para subir e decolar.
  • Não alimente ou tente salvar morcegos feridos ou mortos.
  • Se observar fezes de morcego dentro de casa, você deve estar com um inquilino ou visitante. Use luvas e máscaras para proteger nariz e boca quando for fazer a limpeza. Guarde frutas em local fechado.
  • Se todas as medidas forem tomadas corretamente, não morcegos e humanos podem conviver tranquilamente.
  • Se você for mordido, lave a área com água e sabão e procure um médico para tomar vacina anti-rábica.
  • Para remover o animal, o recomendado é usar uma caixa ou balde virado para baixo e depois chamar o centro de zoonozes da sua região.
  • No município do Rio de Janeiro, você pode entrar em contato com o Atendimento 1746 da Prefeitura do Rio de Janeiro para solicitar a retirada do animal ou entrar em contato por e-mail zoonoses.ccz6@gmail.com.
  • Se a sua região possui muitos morcegos, durma com as janelas fechadas ou instale redes.

Morcegos na bruxaria

  • Os morcegos são animais considerados marginais, eles ocupam o limiar, estão em cavernas, florestas e voam. O comportamento deles ligados a noite e seu papel fundamental na fertilidade da terra traz a ambiguidade bem característica dos deuses do submundo.
  • Eles sempre são retratados em decorações de halloween, ligados às bruxas, a cultura gótica e práticas ligadas ao contato necromante.
  • Eles podem atuar na sua prática como referenciais dos espíritos dos mortos, assim como psicopompos, mensageiros ou símbolos de divindades do submundo ligadas a noite, morte e mundo onírico.
  • Em feitiços, eles podem atuar como símbolos do parasitismo energético trazendo eles como sugadores de energia vital ou como purificadores retirando maldições. Eles podem ser representados em desenhos, pinturas, estátuas, tatuagens ou amuletos.

Referências

  1. Rocha, R., López-Baucells, A., & Fernández-Llamazares, Á. (2021). Ethnobiology of bats: exploring human-bat inter-relationships in a rapidly changing world. Journal of Ethnobiology41(1), 3-17.
  2. Acero-Murcia, A., Provete, D. B., & Fischer, E. (2023). Morcegos da Serra da Bodoquena.
  3. Instituto Butantan. Guia para convivência com morcegos. Disponível em <https://publicacoeseducativas.butantan.gov.br/web/morcegos/pages/pdf/morcegos.pdf> Acessado em 03/10/2025.
  4. Vigilância sanitária – Centro de Controle de Zoonoses Paulo Dacorso Filho (CCZ). Disponível em <https://vigilanciasanitaria.prefeitura.rio/wp-content/uploads/sites/84/2023/04/CartilhaMorcegosA5_v6.pdf> Acessado em 03/10/2025.
  5. Morcego. Disponível em <https://pt.wikipedia.org/wiki/Morcego> Acessado em 03/10/2025.

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