Ritos de passagem

Nascimento

Introdução

  • O nascimento é o ato de iniciar uma vida. Esse processo ocorre de diferentes formas em cada organismo. As plantas começam a viver quando a semente ou esporo germinam gerando uma nova planta. Seres unicelulares como bactérias, nascem a partir da divisão celular. Animais que colocam ovos (ovíparos) nascem a partir da eclosão do ovo. Animais que tem embrião que vivem no interior do corpo da mãe (vivíparos) nascem a partir da saída do feto de dentro do útero, em um processo chamado parto.
  • No entanto, como a vida pode ser encarada também como oposto da morte. Pode-se considerar que a apartir da fecundação já se tem uma nova vida. A discussão sobre o que é vida e quando ela se inicia, além de temas correlatos como o aborto, fica para um novo texto.
  • Outra forma de encarar o nascimento é do ponto de vista psicológico e emocional. Quando damos vida a novas ideias, planos e objetivos. Muitas vezes gera sofrimento deixar morrer partes de nós para dar lugar a novos aspectos que sejam mais proveitosos para o nosso desenvolvimento. Todo sonho e objetivo precisa de uma gestação (planejamento) e precisa ser nutrido com atitudes para que gerem bons frutos. 
  • Hoje entenderemos como é ritualizado esse rito de passagem do nascimento em diferentes culturas para que você construa suas próprias tradições.
Ilustração de Amanda Greavette.

Grécia Clássica

  • As deidades protetoras da infância eram chamadas de “kourotrophoi” ou “kourotróphos” (grego κουροτρόφος, ΚΟΥΡΟΤΡΟΦΟΣ, criadora de crianças, educador de crianças, enfermeira dos jovens). As mais comuns são Ártemis, Deméter, Geia, Hécate, Héstia, Leto, Héracles, e as ninfas.
  • Os partos na Grécia Antiga aconteciam em casa, no quarto das mulheres, chamado de gineceu, com auxílio de uma parteira, chamada maia. Era uma atividade exclusiva das mulheres.
  • Eram feitas preces a deusas como Ilítia e Ártemis. 
  • Quando o bebê chegava, as mulheres soltavam um grito ritual, o “ololugê” (ululação). A criança era então envolta em panos e a mãe fazia uma oferta de agradecimento às deusas que lhe ajudaram. Essa oferta podia ser uma peça do enxoval que a mãe tivesse feito para a criança. Os garotos não eram circuncidados. 
  • Colocava-se na porta da casa um ramo de oliveira se o bebê fosse menino ou um filete de lã se fosse menina. A criança então passava por uma série de rituais, em especial quatro:
    • Amphidromia (Ritual de Boas-Vindas ao Recém-Nascido)
    • Onomatodosia ou Dekatê (Imposição de nome)
    • Apatouria (apresentação da criança ao clã)
    • Khoes (o primeiro cântaro)
Ártemis Kourotrophos, terracota, 430-400 AEC.

Era Viking

  • O nascimento era determinado pelas Nornas. Durante o parto era comum fazer orações para Frigg e Freyja para a criança e a mãe serem protegidas. Também eram feitas canções galdr.
  • Após 9 noites do dia do nascimento, o bebê é reconhecido pelo pai, colocando a criança no colo, aspergindo água sobre a criança e dando-lhe um nome, na cerimônia com nome “Vatni ausa” (aspergir com água). Agora a criança era admitida na família, garantindo os direitos da criança. A criança não poderia mais ser morta ou abandonada pelos pais sem que fosse considerado assassinato.
  • O nome da criança normalmente tem relação com homenagens a ancestrais ou divindades.
  • Existem relatos que nesse momento a criança também recebe presentes de convidados.
Cerimônia de nomeação viking.

Cristianismo

  • O evento de nascimento mais marcante para os cristãos é o nascimento de Jesus, também chamado de natividade. 
  • Nos evangelhos canônicos de Lucas e Mateus, o menino Jesus nasceu em Belém, na província romana da Judéia, de Maria, que seria virgem. Esse nascimento aconteceu após uma viagem de Nazaré para Belém para a um censo. Jesus teria nascido em uma estalagem simples, em uma manjedoura, um recipiente onde se deposita comida para o gado. O rei Herodes ordena matar todos os garotos com menos de dois anos por medo do possível rei dos judeus. Com isso, a família de Jesus foge para o Egito e retornam para Nazaré após a morte do rei.
  • O ritual de passagem do cristianismo que celebra o nascimento de Cristo é o Natal, ocorrendo na noite do dia 24 para 25 de dezembro. Nesta festividade muitos elementos das comemorações pagãs do hemisfério norte foram agregadas a prática cristã. Entre elas, estão o pinheiro enfeitado, o banquete e guirlandas natalinas.
Cerimônia de Wiccaning.
  • Quando uma criança nas nasce no paradigma do cristianismo, ela pode passar por ritos diferentes dependendo da vertente do cristianismo onde a família se encontra. Os católicos, em geral, passam a criança por um batismo em águas que é uma purificação e uma iniciação no cristianismo. Muitas pessoas batizam seus filhos ainda crianças para ter a segurança de um destino favorável para a alma deles. Já os protestantes contam com uma apresentação formal da criança para a comunidade firmando o compromisso de criação nos preceitos cristãos e a iniciação ocorre só na adolescência.

Wiccaning

  • A cerimônia do Wiccaning é uma tradição entre os bruxos da religião Wicca. O objetivo dela não é comprometer a criança a seguir a Wicca ou para salvação de suas almas, mas invocar a proteção dos deuses para o favorecimento da criança.
  • A Wicca, como a bruxaria, não é poselitista, ou seja, não visa converter pessoas a sua fé. Com isso, cada pessoa tem o direito de decidir o seu caminho espiritual, independente das crenças familiares.
  • Na prática do Wiccaning é possível nomear um padrinho ou madrinha para a criança para atuarem como tutores.
Cerimônia de Wiccaning.

Hinduísmo

  • A cerimônia para dar o nome a um bebê se chama namkaran puja (“nama”, nome; “karana”, fazer ou efeito) ocorre em geral no décimo segundo dia após o nascimento do bebê. Apesar disso, também pode ser realizada a qualquer momento entre o décimo dia após o nascimento e antes do primeiro aniversário. A cerimônia acontece em casa ou em um templo. Ocorre da seguinte forma:
    • Os primeiros dez dias após o nascimento de um bebê são considerados “impuros” e “mau agouros”. Quando o período de 10 dias termina, a casa é limpa e santificados. 
    • No dia auspicioso, que varia conforme a região, a mãe e o recém-nascido participam de um ritual de banho. 
    • Após o banho, a mãe seca o bebê em uma toalha nova e aplica o “kajal”, ou delineador para os olhos, e faz uma marca de nascença na bochecha.
    • A criança é colocada no colo do pai para ser abençoada. Em variações da cerimônia, a mãe molha a cabeça do bebê como um ato de purificação.
    • A criança é, então, dada a avó paterna ou ao pai, que vai estar sentado ao lado do padre. Um fogo sagrado é aceso e o sacerdote invoca os deuses para conceder suas bênçãos sobre a criança.
    • O nome da criança é então escolhido, com base em um alfabeto particular, que é determinado pelo tempo e data de nascimento. Segundo o Grihya Sutra, o nome deve soar agradável, ser fácil de pronunciar e ser um indicativo do sexo da criança. Também, há geralmente um número específico de vogais e consoantes que devem estar no nome e ele deve simbolizar a fama, riqueza ou poder, juntamente com a casta da família da criança.
    • O pai então sussurra o nome escolhido na orelha direita do bebê, seja através de uma folha de betel ou quatro vezes, dependendo da tradição regional. O bebê normalmente irá receber quatro nomes: o nome nakshatra, que se baseia na constelação em que a criança nasce, o nome da divindade do mês, o nome da divindade da família e o nome popular, pelo qual a criança será conhecida.
    • Quando a cerimônia termina, os amigos, parentes e sacerdotes abençoam a criança e colocam mel ou açúcar em seus lábios. Se a criança aperta seus lábios, é considerado um bom sinal e traz muita alegria entre os presentes. 
    • Há também uma festa para os convidados e sacerdotes que fecha a cerimônia.
Namkaran Puja.

Nativos Munduruku

  • Na tradição do povo nativo da etnia Munduruku que vive na Terra Indígena Kwatá-Laranjal, no Amazonas existem diferentes crenças ao redor do nascimento. 
  • Para eles o bebê é formado a partir da junção do sêmen do pai ao sangue menstrual da mãe, por isso, evitam ter relações sexuais durante este período funciona como um método contraceptivo. Além de proteger suas mulheres contra a gravidez causada pelo boto que é atraído pelo sangue.
  • O desenvolvimento dos órgãos internos e externos do feto fica a cargo do deus Karusakaibu (citado nos mitos como criador dos Munduruku, dos animais de caça e dos artefatos culturais).
  • No nascimento, a mulher é aconselhada a não contar ao marido sobre o início do trabalho de parto, porque isso pode fazer com que seja mais doloroso e demorado. Assim, elas só avisam quando as contrações estão fortes e avançadas.
Mulher da etnia Munduruku e seu filho.
  • As mulheres Munduruku têm a possibilidade de parir no hospital ou nas unidades de saúde. No entanto, o parto para eles é íntimo e familiar, então preferem que seja em casa, e lá podem também contar com o apoio de médicos e técnicos de saúde do polo.
  • Aquelas que optam por parir em casa contam com o apoio de uma mulher que tem o dom de “pegar barriga”, que geralmente são parentes próximas, senhoras que já tiveram filhos, com experiências em parto, conhecimentos de ervas, chás, banhos e rezas. Por meio da apalpação da barriga conseguem saber se a gravidez é “de gente” ou “de bicho”, além de determinar o sexo do bebê.
  • A mulher tem liberdade de posições: de joelhos, com as mãos apoiadas na rede; parcialmente deitada ou sentada no chão, com alguém segurando pelas costas com os braços ao redor da parturiente; ou “sentada” em um banquinho (um banco de altura pequena, talvez, uns 10 cm do chão), usado especialmente para o parto, com alguém apoiando pelas costas.
  • Depois de todo esse trabalho de parto altamente humanizado, o recém-nascido é amparado pela parteira, que também tem a função de preparar o local de parto, cortar o cordão umbilical e fazer o asseio da mulher no pós-parto.

Referências

  1. Nascimento. Disponível em <https://pt.wikipedia.org/wiki/Nascimento#:~:text=Nascimento%20%C3%A9%20o%20momento%20em,da%20semente%20ou%20do%20esporo.> Acessado em 18/06/2022.
  2. Infância. Disponível em <https://www.helenos.com.br/infancia> Acessado em 18/06/2022.
  3. Nascimento de Jesus. Disponível em <https://pt.wikipedia.org/wiki/Nascimento_de_Jesus> Acessado em 18/06/2022.
  4. Batismo hindu. Disponível em <https://www.ehow.com.br/acontece-batismo-hindu-sobre_148009/> Acessado em 18/06/2022.
  5. Namkaran Puja. Disponível em <https://blogs.devdarshanapp.com/all/namkaran-puja-naming-ceremony-of-the-new-born/> Acessado em 18/06/2022.
  6. Parto na cultura indígena. Disponível em <https://catracalivre.com.br/saude-bem-estar/cultura-indigena-parto/> Acessado em 18/06/2022.
  7. A viking naming ceremony in Gudvangen. Disponível em <https://thornews.com/2016/09/04/a-viking-naming-ceremony-in-gudvangen/> Acessado em 18/06/2022.
  8. Janet e Stewart Farrar. A Bíblia das Bruxas. São Paulo: Editora Alfabeto, 2017.

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